sexta-feira, novembro 24, 2006

Decisões políticas e Desertificação do Mar

O Professor Doutor João Pedro Barreiros defendeu no dia 23 de Novembro de 2006, numa palestra realizada na Escola Básica Integrada dos Biscoitos, que existe um desfasamento entre a visão científica e as medidas tomadas pelo poder político que coloca o mar dos Açores em perigo de desertificação. "Assiste-se a isso quer nas medidas do governo regional como nas aplicadas a nível nacional ou comunitário. Está-se a falar de um negócio que movimenta grandes quantidades de dinheiro. Para além disso, há a questão dos votos. O peso eleitoral sobrepõe-se ao peso cientifico”.

Os Açores compreendem a maior ZEE do País e uma das maiores da UE. A sua diversidade indica que se trata de uma região que funciona como "ponto de encontro" de faunas de diversas proveniências, tais como o Mediterrâneo, o N da Europa, o N de África e as Caraíbas para além das suas características próprias como limite N da Macaronésia. Apesar de se encontrarem à mesma latitude de Lisboa ou de NY, os Açores apresentam comunidades costeiras tipicamente sub-tropicais devido, sobretudo, à influência da Corrente dos Açores, um ramo S da Corrente do Golfo.
Entre as espécies em perigo encontram-se os cavacos, as lapas e a lagosta. “Se observarmos, estas são espécies que podem facilmente ser protegidas, mas que já estão a esgotar os stocks a um ponto que já não compensa pescar. A longo prazo, os mares dos Açores também vão ser afectados pela desertificação”.


O Professor João Pedro Barreiros defendeu ainda ser necessário tomar coragem de “tomar medidas aconselhadas pela ciência, mas que podem ser impopulares”. A ideia de que o mar açoriano tem uma forte presença de espécies marinhas é errada. “Estamos a falar de uma zona que não possui plataforma continental, é funda, tem pouca luz e poucas plantas".

Tendo em conta este cenário, a prática de pesca costeira pode ser prejudicial para os stocks do arquipélago.

Evitar a desertificação progressiva do fundo do oceano passa por um conjunto de medidas de “acondicionamento da pesca”. “Os sistemas de eleições com curtos prazos de tempo levam a que os políticos tomem decisões pelo voto, a curto prazo. Mas é preciso prestar atenção à ciência”.

As medidas adequadas passam pela criação de “pequenas reservas protegidas e patrulhadas, onde não seja permitido praticar qualquer tipo de pesca”.“Isto é algo que nunca se fez nos Açores, mas que deve ser realizado. É claro, para isso, é preciso que essa patrulha seja mesmo uma realidade”. Para a realização desse controlo das áreas protegidas, o Professor João Pedro Barreiros reconhece que a responsabilidade não reside apenas no Governo Regional. “É preciso que o Ministério da Defesa assegure os meios para a patrulha desse espaço marítimo”. Para além disso, a criação de zonas marítimas protegidas na região tem um impacte positivo nas áreas de pesca circundantes. “Ao proteger essas zonas, salvam-se espécies que depois se movimentam para as outras áreas. A médio-longo prazo a pesca da região beneficia com esta medida”.

Embora reconheça que os Açores não são a região mais ameaçada, a nível global, pela extinção dos stocks de pesca, João Pedro Barreiros considera que este cenário não é tão distante como se pensa. “Já há alguma semelhança com aquilo que se observa no resto do planeta. Para lá se caminha”. “A procura de produtos do mar é muito grande e faz-se a todos os custos. Se se continuarem a colocar os interesses económicos à frente dos científicos, pode-se chegar a uma situação de ruptura de stocks ".